terça-feira, 31 de agosto de 2021
O poeta debaixo das escadas
Bem debaixo das escadas
sob as solas dos sapatos dos passantes,
o menino destilava seus versos,
derramava suas lágrimas...
Sol a sol,
como se sentença fosse,
o poeta debaixo das escadas
se escondia.
Fugia dos arroubos violentos da juventude,
da maçante tristeza
que adornava a sua alma...
O poeta se escondia
pra guardar-se do mundo,
pra sagrar-se
grande homem no futuro.
E com os olhos salgados de mar,
do mar tempestuoso de sua alma,
certo dia o pequeno poeta
só admirou de longe os degraus...
Não se escondeu debaixo das escadas,
arrastou sua imensa tristeza pelo caminho
e seguiu, seguiu chorando a vida,
cresceu versando morte,
dando nome ao desassossego
que é sentir-se sempre muito afeito ao pesar...
Que é ser feito de palavras a escrever,
de poesia pra deixar
antes de Deus deixar-te ir.
A maioria do tempo eu dormi
Esse ano eu não fiz nada importante;
eu nem quis.
mesmo sem sono, só pra não viver,
eu não tenho saco,
menor vontade de pagar pra ver.
Andei muito depressivo,
andei sozinho,
andei vivendo...
Chutando pedra,
jogando com a sorte,
andando a esmo pela madrugada.
Ah, eu descobri que meu eu solar é uma farsa,
só vivo a noite,
me incomodo profundamente com a matinada.
Esse ano eu deixei tudo pra depois,
exatamente como fiz nos outros vinte e dois.
Não virei piloto de helicóptero,
não fiz um amigo sóbrio,
eu não dei fim em velhos hábitos,
não obtive nenhum êxito.
Eu amei gente,
sobretudo loiras de olhos claros
e umas morenas bem apanhadas.
Amei de novo quem já tinha amado
e chorei amores derramados
por sobre muitos destilados.
Joguei a vida no carnaval,
conheci o outro mundo a contra gosto,
perdi um verão e ganhei outro,
testei meu santo o tempo todo.
Esse ano eu não fiz nada importante;
eu não quis.
A maioria do tempo eu dormi.