terça-feira, 27 de junho de 2017

Segunda-feira

Não me dê bom dia, não mande eu me apressar.
Não me pergunte as horas, nem me acorde pra jantar.

Não fale comigo, não me mande levantar.
Não me peça nada que eu precise me esforçar.

Domingo maldito,
segunda feira tristeza.
Não me note,
sou só um lugar vazio à mesa.

Não conte piadas, não pise forte no chão.
Não faça ruídos, não arranhe um violão.

Não fale de futebol, não me cubra com lençol.
Não entre sem bater, não bata só pra me ver.

Domingo maldito,
segunda feira tristeza.
Não me ligue,
e tirem as facas da mesa.

Não conte dias e meses, não espere interesse.
Não diga nunca o que devo fazer.

Não me venha com teorias, não me fale das suas tias.
Não pense que eu quero saber.

Domingo maldito,
segunda feira tristeza.
Não force o decote,
ainda sou fã de pureza.

Não esteja sorridente, não estou nem pro presidente.
Não sou obrigado a viver.

Não fale que sou mau humorado, não preciso ser engraçado.
Não pense que eu vou ceder.

Do passado

Ela saiu de um sonho pra ser real,
escolheu não ser do passado

Mas foi somente por uma noite,
por meia manhã

Uma chuva,
bons risos, uns chopes,
trezentos metros de pés trocados,
e uma despedida

Foi assim porque ela quis,
porque ela escolheu que fosse,
e eu fui

Eu fiz como nos sonhos,
nos sonhos que se repetiam no passado.

Imagem do dia!


Caju

Trilhas previsíveis
nos nossos álbuns roubados do Barão,
e os desacatos no baixo, a "boa vida",
o "maior abandonado"

As melodias tatuadas,
o rock'n'geral, a vida nos supermercados,
e toda aquela lucidez derramada pelas calçadas do jardim em baixo tom,
as tiradas sem vergonha, as fugas e desculpas
roubadas de Caetano, Chico, e João

Os Novos Baianos e as novas paixões,
encontros por acaso pela praia,
o tempo pregando peças,
levando os seus bordões

E todos os passos cantados,
esses que nunca foram palpites em vão,
são vícios angariados
pela nossa falta opcional de instrução

"Tudo é amor, mesmo se for por karma..."

Tudo é amor, nessa nossa lua deserta, exagerada!

E todos os passos cantados
nunca foram mesmo palpites em vão,
são vícios angariados,
pela nossa falta precoce de crença em sermão

Aceitando doces de estranhos,
em ruas escuras, na calada da noite,
trincando e esquecendo emoções

"Leve, como leve pluma, muito leve, leve pousa..."

Caminhando nas calçadas de pedras portuguesas quebradas,
tanto ou mais quanto os nossos jovens
e não menos portugas corações...

Que pra sempre vão gritar cegos; que somos cobaias,
pares complementares, incorrigíveis em nossa carência sem igual,
somos dois pra amar e cantar, reivindicar em dueto,
um trocado pra ser "carente profissional".

O inverno

Acordei cedo pra dizer pro vento
que você não é mais meu amor,
eu vi nas cartas, nos búzios,
nos seus olhos

Eu vi estampado na face mais pura,
na doce entrega do coração

Eu vi o amor se esvair, vi sumir,
na neblina e na canção

E então acordei pra dizer ao vento,
e pedir por favor,
pra trazer novo amor
pra eu passar o inverno.

segunda-feira, 12 de junho de 2017

Imagem do dia!


Canalhas

Essencialmente magros, os canalhas nos rodeiam,
choram, coram, fingem amor, dor e ciúmes,
roubam, matam, desfiguram,
tem a carne fraca,
e a moral intacta como a de um cristão.

Vivem vida boa, boa vida mesmo,
de televisão, vida de filme bom,
sem miséria, sem tempo ruim,
vida de quem tem dom.

Essencialmente magros, todos tem ossos fracos,
sofrem demais, vivem quebrados,
morrem sozinhos, e como os passarinhos,
tão frágeis, tão pequenininhos,
por vezes são tristes demais.

Canalhas por toda parte,
canalhas na internet e na tevê,
canalhas nos jornais,
canalhas pelas ruas pra todo mundo ver...

Essencialmente magros, eles nunca morrem de fome,
por menos matam homens,
por pouco vivem muito, vivem demais,
canalhas, choram, coram, fingem amor, dor e ciúmes,
roubam, matam, desfiguram,
tem a carne fraca,
e a moral polida, intacta como a de um bom cristão.

quinta-feira, 1 de junho de 2017

Interno

Meu contínuo fado pessoal
estremece com a possibilidade de felicidade,
esconjuro essa plenitude burra de minha vida,
essa coisa do sorriso fácil e da alma vívida.

O escuro parece ser mesmo o meu lugar,
e meu corpo nega toda e qualquer investida à luz do dia,
minha sina parece ser
apenas viver no meu lugar, apenas ficar por lá.

O fado não pode terminar,
os meus versos mudos não devem acabar,
meus versos versados pelos olhos cheios de lágrimas devem continuar,
persistem, revivem, apenas devem continuar.

Pois a palavra é meu grilhão,
o sofrer meu carcereiro,
e eu, um interno satisfeito.