sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Vento e chuva

Vento e chuva
aliciam minha tristeza pelas frestas
e mesmo com o cristo lá fora
nem sei a quanto tempo eu não abro a janela.

A noite habita as ruas,
e aqui dentro...

Só escuto o que quero escutar,
eu só vejo o que não devo,
só me entendo com o que ninguém vai se importar.

Mas as luzes e as nuvens baixas do horizonte
toda vez são melhores do que antes,
a escuridão da noite
é sempre assim, tão importante.

Que eu não perco um minuto da madrugada
e apago sempre quando sinto o dia
me trazendo o sol na ponta da faca.

Faz tempo que confundo
a luz do mundo todo
com as luzes do jockey.

Fazem noites que não durmo,
fazem dias que não vivo...

E esse é um norte solitário,
mas é dos mais maduros que encontrei,
está entre as coisas mais plenas e suaves
que já experimentei.

terça-feira, 15 de outubro de 2013

Te amo mas não presto

Será que os meus dias frios
são os seus também?

E que você espera as minhas palavras secas
como eu espero o jeito que você me faz aguar?

Eu juro pela minha vida,
eu te entrego o coração na mão,
só pra ouvir uma mentira qualquer,
um eu te amo, eu te quero,
vem me ver.

Será que os meus dias perdidos
são os seus também?

E que qualquer coisa que eu digo,
quando tem amor é só de você que eu falo?

Será que você não percebe
que eu te amo muito mais do que eu declaro?

Eu juro por qualquer parada
que não é minha intenção te deixar magoada,
mas é que às vezes é amor demais,
é muito amor demais,
muito amor demais pra mim...

Porque eu te amo, mas eu não presto,
eu nunca prestei, mas nunca menti.

E eu não sei ser de outro jeito,
assim é tudo tão mais fácil pra mim.

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Gosto

Gosto quando a chuva chove de manhã,
quando céu amanhece coberto de lã...

Gosto do mundo,
quando nada parece com o mundo.

Gosto de gente dormindo,
gente calada, sem muitas opiniões.

Gosto de olhar e não ver muitas coisas,
gosto de poucas pessoas.

Gosto de andar olhando pro céu,
no céu nunca tem ninguém.

Gosto do farol vermelho na noite,
perfeitamente inútil, sem nunca se ressentir.

Gosto de não gostar,
de não me importar com quase ninguém.

Gosto de palavras,
de brigas e risadas.

Gosto de ser de você,
gosto de não ser ninguém,
e de não ser de ninguém também.

Gosto dos seus olhos pretos de graça,
gosto dos seus peitos, do seu jeito,
da sua cara de tarada...

Gosto de te comer com os olhos
e fingir fascínio quando você me dá bola,
de enrolar na cama
e falar do cazuza por horas...

Gosto quando tudo de repente importa,
e o amor meu se instala no seu pescoço,
nas suas costas, nos seus cantinhos,
no nosso apego pela imagem de casal cínico.

Gosto das cismas, dos diminutivos,
dos filhos que nunca teremos.

Gosto de pensar que vai tudo bem,
quando tudo está de mal a pior...

Gosto de você,
gosto de estar só.

Gosto de ser dúvida,
gosto de te ver dormir com a luz da lua...

Gosto das suas pintinhas,
das suas estrelinhas,
gosto dos cachos,
dos seus descasos,
do seu sorriso,
e do jeito que eu acredito
quando você fala que...

Tudo está tão bem assim,
tudo está tão bem.

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Bárbaros em stand-by

Inaptos da terra,
se levantem.

Incautos e inatentos de todos os cantos,
venham comigo.

Vamos sair por aí,
sem destino, pra dizer qualquer coisa,
pra descobrir que a Atlântida do mundo
está no inconsciente.

E então distraídos venceremos,
seremos a âncora de um novo pensamento,
estaremos no fundo da alma,
plantando consciência na beira do abismo
onde se divide o medo da existência e da razão.

É preciso ser sincero,
destrave a língua,
e largue a míngua essa mania de politicamente correto,
isso não passa de um novo conceito barato de imoralidade aviadada.

E o mundo sempre foi imoral,
sempre fomos imorais,
ser humano é imoral desde Adão e Eva.

No fundo,
num fundo nem tão fundo assim,
ainda somos animais,
com as mais terríveis maneiras,
palavras e verdades...

Sempre fomos animais,
humanos animais, bárbaros em stand-by.

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Desistem

Será que você não vê
que as pessoas sempre desistem de você?

Será por que?

Se não é por mal, nem é por bem,
é só porque sempre foi assim.

Meio sozinho, meio perdido,
olhando pro nada, sem saber de nada,
caminhando e cantando por nada,
sorrindo por nada, chorando por nada...

Faturando só o que vem nos olhos
quando vem de encontro e nada pode mudar.

Só o que estava escrito nas esferas do senhor
e que nenhum amor maior pôde levar.

Será mesmo que é assim tão grave?

Viver tudo no humor do vento,
no passo de gato sonolento,
sem comprometimento,
sem se importar muito com tempo
e com o que vem com ele...

Será que é mesmo assim tão ruim?

Achar que tudo vai dar certo no final,
que o acaso é o senhor da vida,
e que qualquer página sofrida
de repente vai virar...

Será mesmo?

Eu penso às vezes,
só às vezes...

E quando penso muito,
penso que não pode tanta gente estar errada.

Eu vejo,
entendo, eu sei.

Mas é que sempre foi assim,
e é assim que eu sei que vai tudo muito bem.

É assim que vejo com algum gosto o mundo funcionar,
de fora, de longe, acompanhando os problemas do alto,
avaliando uma ou outra incursão estratégica
pra não me sentir parte disso tudo.

Não me sentir muito mal
de me tornar qualquer coisa que nunca quis ser.

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Lonjuras

Enquanto eu tiver
alguma coisa pra dizer,
alguma coisa em mim
vai estar gritando você...

Porque é por isso que ainda vivo
e mantenho como um vício esse fascínio
pelo mundo violento que você me apresentou.

Cada poro do meu corpo
é como um louco diferente
dentro de um só eu...

E ainda que esses átomos todos se rebelassem,
ainda que em vida todos eles me trocassem,
haveria alguma coisa inexplicável pra sentir,
certamente eu ainda teria um grito de amor seu em mim.

E é por isso que enquanto tudo isso me corrompe o amor a vida,
tropeço com você em nobre horário,
explorando outras feridas, repartindo os olhos mel,
entregando ao mundo o céu do meu agora ínfimo paraíso.

O meu último e real desejo puro de criança,
pra quem quiser olhar, bem ali na frente,
perfeitamente intocável, já sem nenhuma esperança...

E é assim que chego ao ponto
onde me arrasto pelos cantos,
procrastinando, relendo todos os cantos
que eu nunca cantei pra você...

Todos os que eu fiz por não ter mais o que dizer,
não ter mais com o que lutar
e nem saber pra onde correr...

Enquanto você me faz pensar que fui escola,
cobaia, laboratório, um ensaio...

Alguém que reagia as esmolas
de qualquer atenção que você estivesse disposta a dar,
de qualquer textinho pronto,
qualquer coisinha com algum amor nos olhos e uns diminutivos.

E é por isso que enquanto tudo isso acontece,
o que me resta é me agarrar a alguma prece,
alguma informalidade mundana,
um troço que não me roube
e nem envenene essas doces lonjuras
das coisas melhores da vida...

E que ainda alimente alguma distância saudável
além da natural,
entre a cabeça e o coração.

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Sol

Todas as verdades do mundo já não bastam,
to precisando das suas mentiras,
eu to querendo um pouco dos seus olhos,
de tudo que eles não me dizem mais...

Eu senti cheiro de sábado e era quarta feira,
achei que a vida era linda mas era segunda-feira.

E o sol...

O sol é seu cúmplice, junto da primavera,
que só vem pra me confundir nas areias,
como nas cenas das novelas no leblon.

E todas as verdades, essas, já não fazem sentir,
não fazem valer grande coisa.
Eu preciso mesmo é das suas mentiras,
daquelas coisas choradas sem razão...

Do drama pela Chaika,
do luto as casas derrubadas da semana,
da birra e das suas manias de menina mimada.

E o sol...

O sol é sempre seu cúmplice,
me traz você sem razão, como a luz,
o tempo todo, com som e imagem, num replay...

Destravando seus discursos,
anunciando a morte da nossa originalidade,
a morte da saudade,
nesse mundo que não dorme e vive online...

Rodeado dessas tecnologias arrasadoras,
destruindo as lonjuras,
desconstruindo linguagens,
roubando o sofrimento com um descaso frio,
sem nenhuma cerimônia.

E o sol...

O sol sempre esteve lá,
cúmplice de todos nós.

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Coisa linda

Quantas vezes ainda posso
me apaixonar por você?

Parece que o senhor das esferas
não se cansa de rever esse jovem clichê...

E me faz sentir tudo de novo,
nada novo.

Só você... e os seus olhos castanhos,
o céu refletido, um sorriso,
uma foto bacana, um jeitinho de anja,
num mundo meio art nouveau,
coração partido, zona azul.

E tudo isso, quem me apresenta
sem grande deferência,
é o destino...

Num ensaio rico de maldades,
textos prontos sem muitas verdades,
repleto de idéias tão rasas
que me fazem sentir uma metade.

E eu só preciso mesmo
de um cantinho pra poder dizer...

Vem comigo!

Foge pro aconchego avarandado do meu coração,
rapte-me da falta de paz, da solidão.

Interprete tudo que eu digo
como um grito de socorro,
e volta pro meu lado triste
que é pra ele ficar feliz de novo.

Gata, ta tudo nas esferas,
eu vi!
Ta tudo explicado nas telas
de uma outra dimensão.

Gata, o futuro é coisa linda,
eu vi!
É tudo uma suave neblina,
doçura, carinho, uma vida,
feita toda pra se apaixonar.

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Santo sujo

Se o tempo pudesse
parava em cinco oito,
e devia...

Porque nunca chega de saudade
ver aquela realidade tão distante,
deste dia.

E o cento e sete,
a Elizeth, a bossa, a fossa,
a nossa grande dor
de viver pra ver essa ipanema apocalíptica,
especulada, loteada, agonizando com a fama,
como no apagar da velha chama.

Mas essa dor tão presente,
tão cruel e insistente...

Não me pega pela Montenegro,
perdão poeta, mas ainda é cedo.

Fosse eu, te punha nas Acácias,
e fazia dessas bandas um culto aos teus vícios imorais.
Fundava o sindicato da bossa sempre nova
e abria o cinema dos teus olhos na Visconde Pirajá.

E por falar em paixão, Tom,
te resgatava logo que pudesse daquele esquisitíssimo Galeão,
e em teu nome plantava palmeiras imperiais
pelos escassos canteiros
devastados por Sergios Dourados
e outros sem jeitos, sem poesia.

E se desse tempo, eu acho que me arrependia,
voltava, tirava Vinicius das Acácias,
botava de vez entre a Maria e a Joana,
ali na Senhora da Paz...

Na marra, eu arrumava uns milagres
e pagava pra ver o santo sujo,
o aluno do místico...

Verdadeiro barão de ipanema,
imortal, eclesiástico...

E ainda me faltariam títulos,
e não haveriam adjetivos,
se por acaso não existisse paixão pra explicar...

São sujo,
o defensor das causas imorais.

De Moraes.