sábado, 30 de novembro de 2019

Senilidade

A senilidade me salva,
desisto de ter que entender,
preciso sorrir como um louco
e sair nesse sol para sobreviver.

Tem dias que são noite
e noites que parecem anos,
às vezes eu me pergunto
onde tudo fugiu dos meus planos...

O Rio é mais selva que nunca,
a cidade flui caoticamente em contramão,
mas a senilidade me salva
e eu finjo que tudo ainda é tão bom.

Porque tem anos que são terríveis
e décadas que nos cansam,
às vezes eu me pergunto
como é que os humanos não dançam...

Mas a senilidade me salva,
já que eu nunca vou entender,
preciso ter sorte
e seguir desatento
para não desistir de viver.

Imagem do dia!

Júlio Barroso - 1982

Não encontrar ninguém

Antes que tu conte outra
eu preciso falar,
implico com esses caras bestas
que só sabem viver de mar.

E antes que tu cante outra
eu não gosto do Jeneci,
prefiro ouvir coisas mais tristes,
coisas que nunca terminam bem.

Eu sou como a nuvem que precipita,
eu vivo como ao mundo vim,
preciso acabar de uma vez com as mentiras,
não gosto de te ferir.

Mas antes que tu conte outra,
eu preciso falar,
detesto essa gente besta
que só sabe viver de bravata.

E antes que tu cante outra,
por favor, eu preciso dizer,
que eu não gosto do Camelo,
e não suporto esse novo estilo de pedantismo fuleiro.

Eu sou como um pássaro burro
a revoar na contra mão das andorinhas,
querendo sem medo
um inverno sem fim.

Eu sou um louco pela cidade nas madrugadas,
torcendo apenas para ter a sorte
de nunca ver ninguém...

Enfrentando as ruas vazias
de peito aberto e olhos tristes,
pedindo apenas para ter a sorte
de não ter que ver ninguém.

E antes que tu cante outra,
por favor, eu preciso dizer,
não bote outro disco na vitrola
que eu não quero mais ter que saber nada da vida.

terça-feira, 12 de novembro de 2019

As coisas mais lindas

Ainda posso sangrar por qualquer coisa à toa,
nem toda ferida é boa, mas preciso provar,
do mundo todo, as coisas mais bonitas
podem machucar...

Eu vivo querendo não querer demais,
prefiro dizer que tudo vai tão bem,
mesmo que não esteja, eu posso falar,
e posso sorrir também...

Ainda posso sangrar,
com o rosto tomado pela sensação
de paisagem plena, de dor lá bem longe,
muito, muito longe, em outra estação...

Que eu vivo querendo não falar demais,
preciso e prefiro sentir bem melhor
as coisas do mundo que me atordoam,
as coisas doídas.

Ainda posso sangrar,
e viver de sangrias,
pra baixar a febre desse amor demais,
deixar esvair as coisas vazias...

Porque eu vivo pelas negações,
e os mais de mil dias
que eu escolhi não viver,
pra aprender a dizer
as coisas mais lindas.