segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Ninguém morrerá hoje no Leblon

Ninguém morrerá hoje no Leblon,
não poderia,
e se morresse eu não me importaria.

Ninguém morrerá hoje nesse lado da cidade,
bem poderia,
mas se morresse, eu não me importaria.

Se estourasse uma revolução,
se fuzilassem todos os cristãos,
se Heródes de repente fizesse uma nova aparição,
eu poderia me importar,
eu deveria, sim...

Se reeditassem Hiroshima,
se reprisassem Nagasaki,
se houvesse um novo Hitler,
um novo Napoleão Bonaparte,
eu deveria me importar,
eu deveria, eu acho...

Mas ninguém morrerá hoje no Leblon,
não poderia,
e se morresse eu não me importaria.

Ninguém morrerá hoje desse lado da cidade,
bem poderia,
mas se morresse eu provavelmente não me importaria.

Se houvesse um atentado num cinema,
se explodissem o Cesar Park em Ipanema,
se envenenassem a todos,
se pusessem fogo nos morros,
se destruíssem o Rio,
eu deveria me importar,
eu deveria realmente me preocoupar...

Mas ninguém morrerá hoje no Leblon,
não poderia,
e se morresse eu provavelmente não me importaria.

É que ainda não sei onde deixei o coração,
e dá última vez que procurei
ele ainda estava com ela no Leblon,
por isso eu não ligo pro mundo,
nem pra esse mundo logo aqui ao lado...

Porque ninguém morrerá nem tão cedo no Leblon,
muito menos ela,
e está com ela o meu coração.

terça-feira, 25 de agosto de 2015

Sinto mundos

Pelas noites deste povoado,
deste lado azulado do Rio,
eu sinto mundos,
sinto muito, muito mesmo,
tanta coisa que não sei dizer.

Esquento o sangue,
tiro o pó da estante,
limpo os olhos,
os óculos.

Ah, como eu sinto,
e sinto tanto,
sinto tudo,
sei de tudo e quase nada.

Vivo mundos esparsos,
lados da moeda que nunca se viram,
me viro, me corto,
me desfaço, desperto,
eu sinto muito,
eu sinto mundos,
mundos que não sei contar,
me faltariam números,
me faltariam dores pra nomear...

Então eu sinto muito,
e quando o muito me falta,
eu sinto mundos,
mundos e mundos de dor.

domingo, 23 de agosto de 2015

Não sou ninguém

Sim, eu não sou ninguém,
não represento nada,
não trago amor o suficiente pra ter luz própria,
nem sou indecente o suficiente pra ser um vampiro.

Eu vivo numa borda,
caminho numa margem,
mergulho de quando em vez num rio de felicidades,
ah, também tenho umas vaidades,
nada grave, nada grave.

Sim, não sou ninguém,
e morro de medo de um lugar ao sol,
sou muito apegado ao meu lugar ao sul,
especialmente ao meu canto na sombra,
meu canto discreto com banquinho e violão.

Eu vivo um verão todo especial,
eu vivo uma versão da vida inteiramente saturnal,
sou bônus track,
versão do diretor,
sem corte, sem censura,
roteiro feito de amor.

Sim, não sou ninguém,
e sou repleto de fraquezas e de dor,
eu sou defeito,
meu ponto forte é ser quem sou.
E eu não sou ninguém,
só trago comigo um indiscreto brilho,
uma inocência no olhar,
trago cigarro,
arrasto sapatos,
eu bebo um pouco demais.

Sim, não sou ninguém,
e nunca fui, se bem me lembro,
se já quis ser, também não sei,
mas quando estive perto, eu tirei tudo de mim,
e tive ela, até mais de uma,
e enquanto tive, fui bem feliz.

Sim, não sou ninguém,
eu sou um erro, vivo como múltiplo de zero,
já não caminho com quem me ama,
nem como quem ainda ama...

E hoje eu só finjo,
só vivo como quem não se incomoda com nada,
como quem não se importa com o que ela pensa,
ah, eu finjo que não me incomodo com ela tão longe,
e mesmo que a ame, que ainda a ame,
eu já não me aflijo com qualquer dispensa,
eu não derramo, não agito os meus mares por essa sentença.

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Diminutivos

Te entreguei aos meus diminutivos,
paixãozinha,
uma coisinha,
uma pontinha de amor demais..

E não te sintas mal por isso,
não é nada ruim se quer saber,
te entrego aos meus diminutivos porque não sei ser grande,
sou poeta, sofro muito, sofro mesmo,
eu me desfaço em tristezas de escritor.

E quando acho alguém que me ame,
que me queira um bem verdadeiro,
um bem merecedor de um aumentativo,
de uma coleção de bons adjetivos,
eu me escondo, eu me esquivo,
eu me faço de desentendido,
e por carinho, os meus inhos,
eu dedico...

Me entrego, com amor,
por amorzinho, paixãozinha,
por palavras bem feitinhas,
por vontades indisfarçáveis,
pelo seu corpinho,
o seu rostinho do meu lado,
meu ladinho,
de mãozinhas dadas pelas ruas,
pelos nossos cantinhos...

Ah, como é bom,
como é bom entregar-se assim,
entregar-se a farra dos diminutivos,
sem medinhos,
sem importar-se com essas besteirinhas da vida,
essas coisinhas que nos importunam,
esses manuaiszinhos de conduta
repletos de mandos e desmandos...

Ah, como é bom,
como é boa essa vidinha,
como são bons esses casinhos que passam,
que ficam, que nos fazem sorrir,
e nos fazem abrir o peito pro mundo,
e dar jeito em tudo,
um jeitinho pra amar mais,
pra que o amor seja mais,
mais que amor...

E traga pra bem pertinho,
todos os carinhos,
todos os nossos inhos.

terça-feira, 18 de agosto de 2015

Vão passando

No outono dessa cidade
rasga o vento frio a minha cara.

E as noites, que são tão parvas,
estão repletas da tua falta,
me faltam palavras,
me faltam os dias...

As horas passaram tão rápido,
e os meses voaram por mim,
eu não senti...

Já é quase fim de ano uma outra vez,
já é quase um outro ano sem te ver.

Se bem que esbarrei com você outro dia,
eu fingi que nem vi,
eu quase me escondi,
vivo muito abatido,
estou branco, magro demais.

Ah, e as horas passaram tão rápido
desde que você não voltou quando saiu,
e os dias, os meses, os anos se rebelaram,
passaram correndo, todos através de mim.

Tão rápidos, tão súbitos,
que agora já não sei de nada,
não lembro nem o que faço da vida aqui.

Eu ando entregue aos ventos frios,
e aos lugares onde já fui feliz,
porque no outono dessa cidade
me parece tão difícil não lembrar de você.

E as horas vão passando,
tudo continua passando,
os dias, os meses, os anos.

quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Se eu fosse

Ela morre de medo de mim,
penso que tem medo do que eu digo,
ela morre de medo de amar,
e eu só sei falar que amo.

Talvez se eu fosse como o mar
e a tratasse como areia,
talvez se eu fosse como o vento,
e a dobrasse como as palmeiras.

Eu teria como evitar,
teria um jeito de insistir,
eu poderia enfim, enganar.
mas ela não entenderia,
não saberia como me amar.

Prefere estar distante,
nas suas vestes escarlates,
prefere estar bem longe,
flutuando em qualquer outro lugar,
pisando em corações,
abstraindo dilemas,
ignorando um mundo todo
descumprindo qualquer das sentenças.

Ela é do sol, é linda,
e vive um complexo de Ícaro,
eu me sinto vivo e lindo,
encaro meu reflexo feito Narciso.

Talvez se eu fosse como a chuva
e a tratasse como qualquer chão,
talvez se eu não fosse uma criança
e ela o barulho de um trovão.

Eu teria como evitar,
teria um jeito de mentir,
eu poderia enfim amar,
e ela entenderia...
ela me amaria como sempre quis.

Talvez se eu fosse como o mar,
talvez se eu fosse como a chuva,
talvez se eu fosse como a vento,
talvez se eu fosse um pouco mais intenso...

Eu teria como evitar,
teria um jeito de mentir,
eu poderia enfim amar,
e ela entenderia.

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Eu não sei

Elas despejam os seus corpos nas areias,
surrupiam o amor mesmo do mais corriqueiro olhar,
elas caçam, se alimentam, se hidratam dessas paixões,
ah, e como são cruéis, elas são medusas,
são vilãs, por estúpida coincidência,
por descuido ou vocação,
elas são...

E despejam os seus corpos pelas noites,
entre as baforadas dos cigarros
e os lugares da cidade com vampiros pelas ruas,
elas passam, se misturam,
elas não pedem desculpa,
ah, como são cruéis, elas são quase putas,
são delícias, são meninas encantadoras,
e por uma súbita vontade, por milagre,
por qualquer coisa que dá no coração,
elas são...

E não ficam muito tempo sem fazer,
elas fazem, como fazem,
como gostam de fazer,
todos gostam,
todos querem,
e elas fazem tão bem,
ah, como fazem.

Elas despejam seus talentos na cidade,
vão distribuindo olhares,
vão abrindo os apetites,
elas são tão firmes,
desfilam seus corpinhos sempre herméticos,
elas são um tapa na cara
dos homens sinceros e dos céticos...

E despejam os seus corpos nas areias,
seminuas e a vontade,
deixando a vontade por onde passam,
largando passos descobertos,
repletos de liberdade.

E quando esquecem dos olhos perdidos que usam pra fazer tipo,
quando olham de fato,
quando fitam o mundo com os faróis esverdeados,
elas são o perigo, a personificação do mal,
perversas, doentes, bandidas,
mas de um amor celestial.

Elas despejam os seus corpinhos pelas areias,
vão colhendo os olhares de sempre,
escravizando, seduzindo,
e fazem rindo,
achando lindo o sol, o sal, o mar,
elas fazem e fazem muito,
fazem bem e nem percebem,
e o que elas são?

Eu não sei.

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Medo de morrer

Tenho medo do mar a noite,
tenho medo do mar,
medo da noite,
medo...

Tenho medo de te perder,
tenho medo de você,
de perder você,
medo...

Tenho medo de ter câncer,
tenho medo de ter,
medo de morrer,
medo...

Tenho medo do sol de meio dia,
tenho medo do dia,
do sol,
medo...

Morro de medo de morrer de amores,
tenho medo de morrer,
medo de amores,
medo...

Morro de medo de morrer,
de não morrer de amor,
tenho medo,
medo.

sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Blue monde

Seus olhos azuis me enrascam
de tal maneira
que não há sexta-feira
que me tire desse escuro...

São os seus blues,
e o jeito de me encontrar sozinho,
de me deixar perdido,
largado na sarjeta...

É seu full blue,
seu blue monde,
que me consome cada pingo de liberdade,
cada pingo de amor que eu sonego,
cada parte de mim que te ama,
que te adora, te devassa em mente,
te descobre, te sente...

É tudo culpa do seu blue monde,
desse fronte que eu batalho,
dos azuis que me esmigalham,
são os seus faróis mais que sinceros,
e os meus berros nos dias
em que não aguento,
dias em que eu me desespero
pra ter só um pouco de você...

Você é meu suplício,
é minha pena mais que divina,
meu milagre,
mais que amada, deusa...
traz minha alma entrelaçada,
e a cada despedida,
me leva da vida,
me leva da vida...

E é tudo culpa do seu blue monde,
dos seus olhos,
da mania,
desse vício escancarado de ser feliz.

É tudo culpa do seu full blue,
do seu blue monde,
dos seus blues,
do seu blue.