Não posso mais dizer que não
quando a tristeza me bate à porta,
parece que me distancio do meu eu lírico,
parece-me cada vez mais longe
a ideia de sobreviver sendo menos sínico.
Eu preciso relatar, descrever,
falar das coisas com sangue nos dedos,
tristeza na alma, nos olhos, na face,
peso nos ombros, mundo fútil em escombros,
estranheza total ao ver os homens felizes.
Eu simplesmente não posso mais dizer que não,
não posso ser leve,
não posso viver de pensamentos fáceis,
não posso pensar na humanidade como os homens simples.
Preciso ser eu, homem triste,
e debruçar-me nos descalabros mais detestáveis,
colidir com minhas facetas misantropas,
refutar a felicidade burguesa,
desgraçar toda ideia de esperança fabricada...
Eu preciso disso,
pra poder desfilar pelas noites
com um lindo sorriso pintado no rosto,
sabendo, desvendando o vazio de todos,
o desamparo de todos,
a frivolidade de todos,
a vulgaridade dos outros...
Gente morta, morta-viva,
pueril,
sem pegadas nas areias do tempo,
e sem amor,
porque o amor
nunca se compadeceu por gente vã.
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