quarta-feira, 29 de maio de 2013

Esquisita

Ela quebrou minha vitrola e foi embora
entocou a minha brasa, mora?
E me destituiu dos direitos
de buscar ela na escola.

Ela diz que eu forço muito
e até me deu um desses "podes".
Arranhou meu disco "Muito",
depois me deu um vale numa digital store.

Andou folheando uns livros
e deu pra me chamar de fascista.
Mussolini zona sul,
de bermuda, chinelo e uma lista,
de todas as revoluções que eu nem tenho pra fazer.

Ela é completamente louca,
meio índia, oriental,
gelada, perdida, largada,
nesse corpo celeste escultural.

Ela até critica a bossa,
diz que de nova não tem nada.
Não é chegada no som,
não gosta dos poetas,
ela implica com Drummond.

E pra complicar a história
ela adora ouvir Lobão.

Mas outro dia cruzou por aqui
de olhos muito tristes, abatida,
meio cravo, meio canela,
um tanto aguada com a vida.

E me disse umas coisas,
depois não quis ouvir outras.

Pediu desculpas pela vitrola,
disse que nunca mais me amola.
Me deu um beijo e só olhou pra trás lá de fora,
no fundo sei que torceu pra eu não fechar a porta.

E então sorriu pra mim,
correu, voltou pra mim...

Squizotérica, mente,
súbita e tortuosa, mente,
só pra não se explicar,
pra não complicar.

Linda, leve, louca...
Esquisita demais.

O suicídio do filho pródigo

Nesse teatro de fantoches tudo me incomoda,
nessas velhas repetidas cenas,
todos esses luxos, esses pobres ricos de agora,
contando a prata e limpando o sangue.

Tapetes persas, quadros, filhos,
sociedades dispersas, inverdades, suicídio.

Nesse meio as sacadas
se confundem com trampolins pro mar de gente,
passagem só de ida pro asfalto quente.

E então surgem aqueles risos, aqueles de maldade,
pra guardar e depois lavar o sangue na calçada,
quem se matou já estava morto, semimorto, vivendo numa caçada.

Por isso eu compro silêncio!
Pago caro pra levar,
pra manter a pose, não matar ninguém.

Porque enquanto eles pensam em mais do mesmo,
vendendo a alma em vida sem saber,
perdendo aquele olhar, aquele olhinho que brilha sem querer...

Eu vou escolhendo as ruas pra vadiar
e só vejo opacidade em alma, gente pronta pra sumir,
vejo inocência e legitimidade na jaula,
campos de concentração na sala de aula...

E então os mares revoltos da minha mente
me levam pra outro lugar e clamam, pedem por descanso,
pedem que eu encontre um canto,
que emita algum canto que me acalme,
enquanto parto dessa pra melhor.

E depois disso, fatalmente,
não me sinto nada bem,
continuo meio vira-lata,
meio perdido, sem queijo nem faca...

Esperando que cortem as cordas
desse maldito teatro de vampiros.

Esperando que larguem minha alma
e deixem que essas asas voem livres...

Sem mim, pois não sou anjo,
tomei gosto por ser humano.

Por ser errado, e lindo, e certo,
por ter verdades que só a mim fazem sentido.

Entrando em transe sem poder,
sem ter aonde segurar, nem ter pra onde correr...

Sem pés, nem pás, nem paz... Sem buraco pra esconder.

Toda discórdia que agora escorre,
a inveja, a escória, é morte.

E vejo agora que o mundo é forte
por segurar sozinho meus pensamentos.

Por realizar sem pausas
todos esses meus lamentos.

E então eu sigo, sigo, sigo...

Mas a rotina de um homem
pode ser a sua carta de suicídio...

O tempo pune, não se engane.

Tic, tac, tic, tac... Tic, tac, tic, tac...

Esse é o som do filho pródigo
que se vai pra não mais voltar...

E do vale do silêncio que agora ecoa... Voa! Voa! Voa!

domingo, 26 de maio de 2013

Insuportável

Ela é insuportavelmente sedutora
e me faz lembrar que eu preciso de uma nova calculadora,
que é pra calcular, quantas vezes eu penso em matar ela...

Ela é insuportavelmente indie,
vive o dia inteiro com suas bandinhas no fone,
e me faz pensar o quanto é cafona
o meu ringtone dos Mamonas.

Me apaixona todo dia,
quando cruza e descruza as pernas,
e vive sempre discursando,
querendo que eu ria de piadas internas.

Ela é insuportavelmente 3x4,
absolutamente preta e branca,
e vive divinamente a recitar
os poemas que eu escrevo pensando em qualquer estranha.

Ela é insuportavelmente ácida,
deliciosamente entregue e tórrida,
escrava de todo clímax,
refém da sina de ser um rótulo.

E me apaixona todo dia
num ritmo de liquidificador,
um curto circuito, um blues de cores mil
que no final só rima com amor.

Ela é insuportavelmente lúcida,
terrivelmente estranha e óbvia,
ela não quer sonhar, vive louca,
muito louca pelas bordas...

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Ode a contravenção

Sinceros vivas aos doutores,
os contraventores deste país.

Um grito a honra dos malandros
que saíram aos seus e roubam aos bandos.

Porque geneticamente falando
há um desastre entre a raças daqui,
miscigenados, ladrões e safados de todas as cores...

Um brinde aos contraventores
a linhagem mais pura da pilantragem.

A face nada oculta desse barco que afunda,
a falta de luta, da puta nação que sofria,
que com a dor latente, ainda que fraca se debatia.

E agora, desmantelada, sofrida, calada,
só atenta aos passos nos corredores,
daqueles que te afogam no sangue da riqueza do teu próprio berço...

E só vê horizonte onde teus filhos acenam
e enxergam de longe que se te deixaram não foi como quiseram.

Sinceros pêsames aos amores de quem parte e deixa
ao já frio cadáver da soberania
a esperança morta na areia da praia
de cara pintada pela democracia.

Ao terror de entender que nada é pior do que uma ditadura
mas que a pura dura realidade da estreita esquerda e direita
não pertence a natura da vida...

Já que qualquer dos dois lados de uma canção desafinada
é tortura, amargura senhor, é tristeza.

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Meios

Nesses dias em que tardo
pasmo menos do que quando amanheço.
E quando por elas ardo
trinco os dentes, quase enlouqueço.

E apesar de tudo
to meio a fim de um fim a qualquer custo,
to meio assim de ainda ter a vida inteira
pra jogar aqui nesse mundo estúpido.

Eu to meio cansado de meias verdades
e de meios tempos nos relacionamentos.

Eu ando meio consternado,
descrente de que os meios não possam se justificar,
já que todos os fins, esses sim, nos comprometem bem mais.

É que eu to com preguiça de assinar presença,
de concordar com essa sentença que faz tudo acabar.

Porque se não for só de pele, nada apaga,
amor não tem metade, fim, nada.

É um exercício atemporal, coisa de elemento,
que só tem rastilho, fogo e uma cinza que sempre arde,
que se for preciso aquece o peito
e sutura a alma quando algo retalha.

Amor não apaga, se guarda, só guarda.

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Feliz natal

Me fala dessa fineza
soletra pra mim a tristeza
de ser assim como todos querem que seja.

Debate-se entre as paredes desse mundo
esqueça as histórias que ouviu de dama e vagabundo.

Me fale dessa sexta-feira
do drama que existe nesse seu jardim cercado imperial.

Que eu te falo das areias,
que eu te faço um carnaval.

Não parece fácil entender as quatro linhas
mas às vezes é que a vida
não é bonita, não é bonita, não é bonita.

Me fale do teu chão de tábua corrida
me explica essa comida
que não é quente nem é fria...

Não se entende tudo isso
é preciso ser omisso
é preciso um pouco mais ou quase nada
a cabeça é que maltrata, que maltrata, que maltrata.

Me fale do pouco que sabe
de tudo que vai além das tuas posses
ainda que seja cedo, ainda que seja morte, seja morte, seja morte.

Me trate como uma de suas distrações,
me aplique como faz quando vaga nos corações.

Por normose, por osmose, simbiose social, paranormal,
é como bocejar... pra oxigenar.

É como amar ninguém e a todos desejar...
Feliz natal, feliz natal, feliz natal.

terça-feira, 14 de maio de 2013

Papo furado

Você reclama do meu papo furado
de gato malhado
de quem só ta aqui pra viver...

Você reclama do meu bronzeado,
desse jeito calmo que eu tenho pra me perder.

E não entende que tudo é bem mais fácil pela madrugada,
e as facilidades, essas você sabe bem como são.

Então me deixa ver a vida assim, com tudo vazio,
coração vadio, cachaça no pão.

Porque não tem outro lugar,
nem ninguém que mereça...

Não há nada melhor do que a volta cambaleante,
sendo vigiado, vagando por entre as palmeiras.
Cuspindo fogo, equilibrando a tensão do traje,
mentalizando um highline no muro baixo do parque lage.

Caminhando absoluto, de olhos exatos,
sem muito pra me preocupar.
Me perdendo pra poder dizer
que só saí pra me encontrar.

Mas você ainda reclama de tudo,
de estudo, de tempo, de amor...
E eu só tenho no peito palavras,
repetidas, bonitas, palavras.

Que é pra dizer que não há jeito,
que não pode ser desfeito...

E que não é direito
querer que o que eu não sou
seja o melhor pra eu e você.

sexta-feira, 3 de maio de 2013

As areias

No caos das tuas areias,
sereias...

Surfistas, sofistas,
despejando suas palavras,
cortando as ondas no vento terral.

E bate o pé no mar, bate coração,
se infiltre na paisagem
na passagem pra outro plano
na viagem de outro som.

No caos dos amores desta gente,
da fumaça intransigente,
desse cheiro de meus deus do céu, sei lá, sei não...

Não ande na linha, não pise na grama
não frite no asfalto meio dia...

Não esqueça a sunga, não se importe se é segunda,
não deixe de olhar umas bundas
e nunca dispense um amor qualquer no pôr do sol.

quinta-feira, 2 de maio de 2013

Imagem do dia!


Obelisco

Nas ruas sombreadas do nosso lugar
de dia ou de noite a vagar...

Distribuindo tapas, esquecendo consoantes
verbalizando tropeços, sem modos pra usar os advérbios.

Caçando os ciscos de sempre
por uma boa desculpa pra chorar...

Perdido no obelisco, rodando no asfalto sem lembrar
pra onde ia, de onde veio,
passado, presente, futuro, ambição, desespero...

Vivendo o luto,
rezando em voz alta pela rua feito maluco.
Resmungando a morte
da bossa já não tão nova...

Reclamando o fim da ginga,
e daquele amor a toda prova.

Sentindo falta do chiado
da vitrola que arranhava...

Rogando a ausência do mundo
que sempre tornava as coisas mais belas.

E fazia a vida menos tacanha,
fazia delas mais discretas,
mais meigas, sem truques, sem manhas.