domingo, 27 de julho de 2014

É proibido pisar na grama

É proibido pisar na grama,
proibido dizer te amo
a alguém que não se ama...

É proibido ser quem é,
proibido ser gente grande e não tomar café,
é proibido proibir em vão,
santa proibição.

É proibido ter muito a dizer,
ninguém mais escuta ninguém por aqui,
é aconselhavel guardar, segurar o fôlego,
estancar as boas e más palavras,
ninguém diz muito mesmo,
todo mundo anda tão vago, tão raso.

Não conheço muitas pessoas que valham a pena,
mas ando com pena de muitas pessoas,
e penso que não é assim nenhuma indelicadeza,
não há mais muita gente aqui,
existem sim algumas coisas, uns vultos,
sombras acorrentadas na rotina,
uns seres esquisitos devastando os cantos todos,
grunhindo, sangrando, debatendo-se sem ao menos sentir
o terror do próprio enclaustro,
desconfio deles,
desconfio que não sentem mesmo muitas coisas,
e talvez nem sintam muito por isso...

Já que aqui hoje há acima de tudo
o desejo pelo que se pode atingir,
o que se pode atingir ao alcance dos braços esticados,
muito pouco se sabe além dos limites corporais,
muito pouco se enxerga além do que se vê,
pouco, muito pouco se vive fora dos acordos sociais.

Afinal, é proibido pisar na grama,
é proibido viver de verdade,
porque a mentira dos outros pode se magoar,
é muito difícil desapegar.

Ando desiludido com essa parte do mundo,
toda essa que ainda respira,
me parece tudo tão desnecessário,
tão saturado esse lance de existir
que acredito que é bastante nobre resistir por aqui,
conseguir chegar ao fim...

Daqui a pouco vão proibir também,
já não se pode nem pisar na grama...

Vai ver é por isso que calçam,
aterram e asfaltam todos os caminhos.

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