Hoje eu vi uma velhinha debruçada na janela,
eram umas seis horas da tarde, ali na maria quitéria,
um último prédio antigo de dois andares,
uma janelinha verde, num dia quente daqueles,
e a velhinha via o mundo passando ali pertinho,
os meninos e as meninas de bicicleta,
as crianças indo e vindo das escolas,
os pais, as mães, os trabalhadores tão cansados,
aqueles mais sofridos e os de sorriso fácil.
A velhinha não tinha tempo pra novos projetos,
não tinha vida pra longas caminhadas,
ela não podia uma porção de coisas,
mas ela sabia do mundo ali pela janela,
ela via nas árvores os passarinhos cantarem,
assistia a melancólica demolição do prédio vizinho,
via o progresso e o caos andarem lado a lado,
ela entendia o mundo, mas demorou tanto, tanto,
que já era chegado o fim da vida...
E ela queria agora contar, queria dizer aos outros,
explicar sua vivência, ditar os manuais da boa vida,
mas ninguém a escutava, era só uma velhinha na janela,
que dava bom dia, boa tarde e raramente boa noite,
era uma velhinha simpática,
de cabelos brancos e vestidos sempre floridos,
era uma velhinha que ficava ali debruçada na janela,
no calor, no caos, no fervor da maria quitéria,
era uma velhinha que ficava na janela,
mas que já não aparece há dias.
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