quinta-feira, 14 de julho de 2016

Alucinações

Pelas noites da cidade eu alucino,
invento e vejo todas as pessoas que eu perco
enquanto passo os dias dormindo,
é que eu preciso dessa paz,
preciso do mundo escuro e frio como eu conheço,
do mundo a imagem e semelhança do meu perfeito aconchego.

Sombria, calma, mortal e acolhedora,
a noite acena amigavelmente para os meus passos,
os meus caminhos, minhas decisões,
ando mais perdido do que nunca,
penso que só nela encontro qualquer norte,
qualquer pessoa que me sirva um copo d'água envenenada numa bandeja de prata,
em qualquer esquina, em qualquer das quadras da cidade,
eu busco um acerto, uma cilada,
busco um amor que me mate, uma decepção que me envelheça,
um sofrimento que me corte, uma felicidade que jorre,
um sentimento bom, uma dor que não caiba no coração.

Pelas noites da cidade eu alucino,
invento e enxergo um pouco de todas as pessoas que eu perco
enquanto passo os dias dormindo,
um pouco de todos aqueles mortos vivos,
um pouco da alma de todos os que me parecem tão sofridos;
é, eu preciso mesmo desse mundo escuro e frio,
preciso desse mundo a imagem e semelhança
do que eu carrego no meu peito vazio.

Caminho, sigo porque ainda procuro qualquer coisa,
qualquer sinal de minha vida,
qualquer pouquinho de pureza que esteja escondida por aí,
pra eu pegar pra mim,
pra eu guardar comigo e ter qualquer coisa pra sentir.

Um terço bom de uma tristeza que sufocou,
uma parte inteira de uma paixão homicida,
uma lasquinha de rancor que deu em guerra,
um bom pedaço de um grande amor que suicidou-se.

Eu quero, procuro pra pegar pra mim,
espero que respondam meu anúncio no jornal,
eu quero um bom pedaço de qualquer coisa,
de qualquer beleza ou desgraça,
pago bem, e quero agora,
antes que seja chegada a hora,
pago bem, e pode ser tristeza ou nostalgia,
mas tem que ser pra agora,
porque eu já não tenho mais saúde pra viver o dia.

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