O mundo me encharca de tudo,
sinto falta da secura,
falta das faltas,
das inevitabilidades,
das complicações,
da desinformação...
Estamos cada vez mais donos do mundo,
muitos donos do mundo, o mesmo, um só;
enquanto esquecemos que somos universos,
somos imensos dentro da nossa pequeneza,
do nosso desassossego,
nosso brilho e nossa pureza.
O mundo me encharca de tudo,
e eu sinto falta da secura, do alheamento,
da tranquilidade de ficar a deriva depois da arrebentação,
de andar sentindo tudo,
e sorrir desavergonhado,
de ser taxado de maluco,
seguir caminho inexplicável.
Nós estamos cada vez mais donos do mundo,
muitos donos do mundo, o mesmo, um só;
e aí esquecemos de nós, das cores,
dos pés descalços na grama ou no asfalto,
do dia lindo que, sim, pode ser segunda feira,
da noite quente de um dezembro há muito tempo,
da lua amarelada, do vento leste,
das constelações nas costas das ex-namoradas,
das meninas ainda amadas, do mais puro gesto,
o abraço amigo, o olhar mais terno,
do amor... nós estamos cada vez mais donos do mundo,
cada vez mais distantes de nós.
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