Não me venha falar de amor hoje,
não hoje que o dia amanheceu assim com esse sol do Saara,
não me venha com essa de contos de fadas,
não me fale de bons finais, de finais felizes,
não mire um futuro comigo, não queira que eu fique,
não me apareça com nada disso por aqui; não hoje.
Não nesse dia que trouxe pra mim essa vontade mesquinha de ver tudo queimar,
de sentir o tempo escapar pelas mãos
e ver tudo de repente se tornar inalcançável,
não hoje nesse dia de desespero,
nesse presente estarrecedor,
com esse céu imenso e cheio de azul que me assassina, me envenena,
me faz sofrer como em sangria, morrendo pouco a pouco.
Não me venha com nenhuma ladainha de felicidade,
não me seduz essa idéia, eu não sinto nada mesmo,
meu melhor sentimento sempre foi essa saudade,
até quando não tinha nenhuma grande saudade,
ah, hoje só não quero nada do mundo,
não quero que esperem nada de mim,
nenhum estilhaço que seja bom ou ruim,
hoje eu não quero a sua piedade,
seu amor, seu sorriso, sua graça,
por favor, não me apareça aqui alimentando alguma dessas farsas.
Não hoje, não hoje que os homens andam por aí de cabeça baixa,
que o preço da gasolina subiu,
que o túnel rebouças engarrafou,
que árvore da lagoa acendeu, que dezembro chegou
e o verão estacionou bem aqui em cima de nossas cabeças,
hoje não, por favor, hoje não.
Espere que anoiteça, que a lua apareça,
que todos se acalmem, que suma essa aura absurda de desespero,
que os surdos ouçam e os cegos enxerguem,
que os loucos sanem e as mulheres apaixonadas não sofram,
que os jovens casais não se desiludam
e as crianças todas tenham um lindo futuro,
venha pra mim falar de amor
no dia que eu me sentir mais leve e seguro,
enquanto isso não fale, não queira, não ame,
não hoje, hoje não.
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